sexta-feira, 13 de agosto de 2010

"Nvio Negreiro"





Castro Alves, autor do poema O navio negreiro.
O navio negreiro é um poema de Castro Alves e um dos mais conhecidos da literatura brasileira. O poema descreve com imagens e expressões terríveis a situação dos africanos arrancados de suas terras, separados de suas famílias e tratados como animais nos navios negreiros que os traziam para ser propriedade de senhores, e trabalhar sob as ordens dos feitores.


Um navio negreiro.
Foi escrito em São Paulo, no ano de 1869, quando o poeta tinha vinte e dois anos de idade, e quase vinte anos depois da promulgação da Lei Eusébio de Queirós, que proibiu o tráfico de escravos, em 4 de setembro de 1850. A proibição, no entanto, não vingou de todo, o que levou Castro Alves a se empenhar na denúncia da miséria a que eram submetidos os africanos na cruel travessia oceânica. É preciso lembrar que, em média, menos da metade dos escravos embarcados nos navios negreiros completavam a viagem com vida.
O navio negreiro é composto de seis partes, e alterna métricas variadas para obter o efeito rítmico mais adequado a cada situação retratada no poema.
Projetos relacionadosAssim, inicia-se com versos decassílabos que representam, de forma claramente condoreira, a imensidão do mar e seu reflexo na vastidão dos céus: “'Stamos em pleno mar... Doudo no espaço Brinca o luar - dourada borboleta; E as vagas após ele correm... cansam Como turba de infantes inquieta. 'Stamos em pleno mar... Do firmamento Os astros saltam como espumas de ouro... O mar em troca acende as ardentias, - Constelações do líquido tesouro... 'Stamos em pleno mar... Dois infinitos Ali se estreitam num abraço insano, Azuis, dourados, plácidos, sublimes... Qual dos dous é o céu? qual o oceano?... 'Stamos em pleno mar. . . Abrindo as velas Ao quente arfar das virações marinhas, Veleiro brigue corre à flor dos mares, Como roçam na vaga as andorinhas...
Note que o poema se inicia com a supressão da vogal E inicial da palavra Estamos, grafada ‘Stamos para que o poeta forme um verso decassílabo. É um recurso tipicamente romântico: a expressão suplanta o cuidado formal.
Na segunda parte do poema, composta em versos redondilhos maiores (heptassílabos), ao seguir o navio misterioso, pedindo emprestadas as asas do albatroz, o eu lírico escuta as canções vindas do mar. Ao se aproximar, na terceira parte, em versos alexandrinos, o eu lírico se horroriza com a “cena infame e vil”, descrita na quarta parte do poema, através de versos heterossílabos, alternando decassílabos e hexassílabos: Era um sonho dantesco... o tombadilho Que das luzernas avermelha o brilho. Em sangue a se banhar. Tinir de ferros... estalar de açoite... Legiões de homens negros como a noite, Horrendos a dançar... Negras mulheres, suspendendo às tetas Magras crianças, cujas bocas pretas Rega o sangue das mães: Outras moças, mas nuas e espantadas, No turbilhão de espectros arrastadas, Em ânsia e mágoa vãs! E ri-se a orquestra irônica, estridente... E da ronda fantástica a serpente Faz doudas espirais ... Se o velho arqueja, se no chão resvala, Ouvem-se gritos... o chicote estala. E voam mais e mais... Presa nos elos de uma só cadeia, A multidão faminta cambaleia, E chora e dança ali! Um de raiva delira, outro enlouquece, Outro, que martírios embrutece, Cantando, geme e ri!
Na quinta parte, novamente em heptassílabos, o poeta faz um retrocesso temporal, descrevendo a vida livre dos africanos em sua terra. Cria, assim, um contraponto dramático com a situação dos escravos no navio. Na última estrofe Castro Alves retoma os decassílabos do início para protestar com veemência contra a crueldade do tráfico de escravos: Existe um povo que a bandeira empresta P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!... E deixa-a transformar-se nessa festa Em manto impuro de bacante fria!... Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta, Que impudente na gávea tripudia? Silêncio. Musa... chora, e chora tanto Que o pavilhão se lave no teu pranto!... Auriverde pendão de minha terra, Que a brisa do Brasil beija e balança, Estandarte que a luz do sol encerra E as promessas divinas da esperança... Tu que, da liberdade após a guerra, Foste hasteado dos heróis na lança Antes te houvessem roto na batalha, Que servires a um povo de mortalha!... Fatalidade atroz que a mente esmaga! Extingue nesta hora o brigue imundo O trilho que Colombo abriu nas vagas, Como um íris no pélago profundo! Mas é infâmia demais! ... Da etérea plaga Levantai-vos, heróis do Novo Mundo! Andrada! arranca esse pendão dos ares! Colombo! fecha a porta dos teus mares!
Leilane Martins Lacerda

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